quinta-feira, 23 de maio de 2013

Anotações sobre o acalanto

Confesso que hoje amanheci tristonha e até chorei no caminho para ir aonde deveria ir, dando passo por passo como quem caminha para a morte. Há tempos que sinto esta angústia, esse nó na garganta, desses bem apertados, daqueles que te causam a ligeira impressão de que existe um corpo estranho que se perdeu e resolveu se instalar em um lugar que não é dele. Caminhava com esse nó e um acesso de tosse. Ia assim, em uma confusão que misturava chorar, engasgar, soluçar e tossir. Era quase engraçado, se não fosse minha tristeza.
Na verdade, estar triste é uma constância em mim. Já quase não me incomoda, acostumei-me com sua presença da mesma forma que o corpo se acostuma com o frio depois de um bom tempo de tremedeira. O que não significa que haja em mim algum tipo de desamor, ou algum flerte com a morte. É apenas aflição de tudo aquilo que sou incapaz de acessar. Tenho, claro, alguns momentos de riso sincero, os quais consigo trocar a água da minha tigela por um punhado de açúcar. O que me impulsiona a escrever neste momento, é esse momento de troca, pois, depois da manhã aflitiva, meu peito inflou-se de uma doçura ímpar, e digo, não por uma conquista minha, e sim, de uma vontade real de compartilhar da felicidade de outro. Aquela coisa da água de lastro. A generosidade de quem dividiu comigo um afeto e uma alegria tão sincera, criou em instantes dentro de mim um novo ambiente. A pequenice que sinto de mim, agora, quase não me incomoda.
Se sou um aquário, algo de mim, de alguma forma, ainda se conecta com o mar. Mesmo minúscula e irremediavelmente vulgar, contenho vida dentro de mim.

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