quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Foi lá e acendeu mais um cigarro. Tragava daquele jeito engraçado de quem está aprendendo a fumar, sabe, quando você solta a fumaça e ela se espalha pra todos os lados? Ela tentava discreta piscar rápido pra eu não ver que a fumaça foi no seu olho e ardeu, mas na verdade não sei se era bem isso ou se ela só não queria mostrar que queria chorar. As pessoas fazem caras engraçadas quando não querem chorar, ficam se torcendo em caretas, achando que passam super desapercebidas com aqueles olhos afetados, e quando olham pra cima então, pra lágrima não escorrer? Eu acho massa, até dá vontade de rir, mas é chato, então eu coloco a língua no céu da boca pra segurar o riso e me concentro nisso e passa, funciona juro. Nossa, eu me desconcerto com gente chorando, não gosto de ver ninguém chorando puta merda, me deixa mal, e viro uma completa inútil, nunca sei o que fazer quando a vontade de rir passa. Mas essa ai não chorava nunca, só fumava. Um atrás do outro. Cheirava bem a cigarro, e apestava todos os cômodos, isso me deixa meio puta, mas eu abstraio, afinal não ia ter o que fazer mesmo. Eu fico cheirando as coisas depois, e corro que nem uma imbecil com um sprayzinho, esses que fazem tshiii tshiii e soltam aquele cheiro de detergente genial. Detergente tem um cheiro de assepsia que me deixa felizona. Nossa eu gostava mesmo dela com aquele cigarrinho andando pela casa, eu tinha vontade de falar, mas ela está sempre muito compenetrada na vida dela, não ia atingi-la de qualquer jeito, então me propunha a ouvir até me entediar. Ai só presto atenção no cigarro, e aquela voz amacia na fumaça que vai dançando pelo ar. Vai montando um monte de coisa até que some, desmancha no ar e nem é sólido. Uma vez fiquei zonza acompanhando com os olhos as espirais. Uma vez eu li que o universo é espiralado e todas as energias se manifestam em espirais para que assim, as coisas possam se enrolar e desenrolar. Se isso for verdade, o universo estava ali, saindo da ponta da extensão de seus dedos cheios de fumo, se desenrolando naquela pequena porção de espaço entre o meu corpo e o dela, mas de tão compenetrada em si ela não viu nada.
Eu também não contei.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Indecisão

Mas há vida!...não, não, isso não é um incentivo muito bom...
Mas há o amor...nossa, menos, dores irremediáveis...
Mas há os sonhos...só que nesse caso, gastaria o resto meu tempo dormindo, como já faço normalmente
Mas há o real...que dói
Mas há...há...mas há alguma coisa.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Sentou na ponta da cama, exausta, e baixou os olhos para as pontas dos dedos. Aquilo me irritava, muito. Olhou para algum canto que eu não podia enxergar e voltou a olhar as pontas dos dedos. Afinal, o que deveria de haver de tão genial na porra das pontas dos dedos?
Ela era bonita, mas algo não deixava isso aparecer. Tinha uma expressão que a enfeiava, talvez fosse aquela cara de sonsa, aquele jeito de falar e aqueles gestos de quem pede desculpa por tudo, até pela existência. Devia ficar o tempo todo "...perdão por existir, eu faço o meu melhor, mas não consigo...", como deprime. Enxugou vagarosamente algumas lágrimas que insistiam em brotar e tentou falar alguma coisa. Tinha os olhos marejados e algumas marcas, não sei se de tempo ou de desespero, que contornavam aquelas duas bolas aguadas. Quando finalmente entendi o que murmurava, era algo como uma reclamação sobre o infortúnio de sua vida, mas não havia peso, é como se aqueles pedaços invisíveis de quarto lhe contassem alguma coisa que eu não via. Olhei a merda dos dedos dela a hora que ela baixou o olhar de volta, e fiquei esperando abrirem-se caras naquelas pontas, tipo mini gente mesmo, que dissessem essas coisas que a gente quer ouvir quando muito aflitos, alguma coisa reveladora sobre o universo, e que as coisas tinham sim um sentido, tudo, tudo tinha um sentido oculto, até mesmo o contrário valia, dedos que contam como o mundo vai explodir dentro de dias, e não importaria nada do que foi feito e dito, porque tudo vai virar poeira cósmica, mas não. Eram só dedos, dedos bem idiotas com metade do esmalte só, e a pele maltratada de fazer serviço, aquela pele dura que machuca quando se vai fazer carinho no outro, nem pra isso servia. Ela se levantou e voltou a limpar as coisas. Abaixou-se para limpar debaixo da cama, tinha muito pó. Minhas coisas tem muito pó, anos de pó, não gosto de mexer nelas, sempre encontro alguma coisa, algum bilhete, foto, carta, poema e isso me deixa com saudade, e não ando em estado de ter saudade, eu fico louca, mas ela estava lá limpando e mexendo em tudo que era meu, me perguntando o que servia ou não. Sei lá, nada servia, me perdi pensando se eu também estaria com pó enquanto a olhava, eu tenho essas coisas de me guardar também, me enforno em alguma gaveta minha e esqueço de limpar, e ai vinha alguém pra revirar tudo. Tenho dó de vê-la no chão, mas não tenho a mínima vontade de ajudá-la. Ela merece, está no lugar certo, no chão, com esse arzinho e esses dedinhos, e depois ia embora e dizia " Fica com Deus, filha". Não sou sua filha, mas só tinha vontade de dizer, odeio que me peçam pra ficar com Deus, mesmo que seja expressão, ele que deveria estar comigo, não eu ter que procurá-lo. Essa ai deve ter tido alguma revelação, ou acha que teve, por isso é tão conformada, quando ia desabar de chorar, tipo criança, se segurava toda e fingia ter alguma dignidade, olhava pros cantos e se recompunha, seria incrível mas esperança me deixa um pouco deprimida. Nossa, ás vezes queria sentar com ela, tomar aquele chá barato e pedir pra que por favor, ela me contasse o que tanto os espaços e a ponta dos seus dedos lhe diziam, eu faria qualquer coisa pra saber o que eles dizem, porque ver além e acreditar em algo, apesar de deprimente, a fazia bem melhor que eu.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Sem título

A felicidade faz parte de um sonho, é como se fosse um farol que nos mostra o caminho a seguir quando nos perdemos no emaranhado da vida. Mas é sonho.
Cheguei a conclusão de que eu nunca vou ser feliz, dentro dessa ideia que fazem de algo ser bem sucedido e leve, não faz parte de mim e não compartilho desse sonho. O que me motiva, é saber que, apesar de tudo que há de ruim, e de toda dor que insistentemente carrego ( dores de grau 8, diariamente), é que de alguma forma, se sobrevive. A felicidade não é o mais importante, o interessante é saber que não se sucumbe e o alto grau de resistência que temos a dor, e que esse grau só tende aumentar. A carne rasgada se sutura, partes quebradas se regeneram, sentidos perdidos se desenvolvem outros. A capacidade de adaptação é o que nos impulsiona a levantar todo dia, respirar fundo e começar tudo de novo.
É entender que apesar do sonho, a realidade é muito mais interessante.