terça-feira, 30 de outubro de 2012

Basta olhar

Sentou a bundona no chão sujo e começou a recolher pedaço por pedaço. Porra! Não bastava ver tudo destruído tinha que ficar limpando, deixa aquela merda lá! Mas não, pacientemente juntava cada fragmento mínimo, limpava e observava como se fosse algo precioso com aquele arzinho infantilóide de alguém que fez uma descoberta muito importante. E aí guardava. Não era bem guardar, ia empilhando os pedaços em um canto pra depois enfiar em um saco e fazer sei lá o que com aquilo. Toda aquela preciosidade de sujeira. Acho que a única coisa intrigante era imaginar de onde seriam aqueles restos. Quem os deixara pra traz. Me diz, hein, que que a gente deixa pra trás? Hein? Porra aquilo serviu pra alguma coisa, foi parte de algo, mas eu não conseguia ver, só ele via, quase conversava com aquele monte de resto. Eu quero saber o que eles dizem! Me diz quais são as coisas que são deixadas pra traz! Eu não quero virar lixo. Não sou resto, não pra mim, mas e pros outros? Já fiz parte de tanta coisa e puta merda, do nada eu não fazia mais. A gente se recolhe? Falta de ar. Eu devo fazer parte de algo. E, cansada, continuei a observar ele recolher os fragmentos do chão. Senti as costas no canto da parede, mas na real, não lembro de ter andado, mas as costas estavam lá, encostadas na quina da parede, escorregando, até que senti o chão. Eu era um amontoadinho de diversos materiais de frente para um outro amontoadinho de materiais, de repente, tão igual. Devastadoramente banal. E ele lá no meio, arrumando as coisas pacientemente. Tirando o excesso de sujeira, o tédio de não pertencer mais a nada. A falta de ar. E ele tratava aquilo tudo como se fosse algo tão precioso. E eu morri de vontade de ser aquilo que ele tanto observava, só pra sentir que de mim, tão resto quanto aquele monte de resto, ainda se podia ver alguma coisa.
Por favor, olha pra mim, então.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Apenas pontuando

E começo a caminhar, sozinha. Viro uma rua, depois outra, ás vezes ria, ás vezes chorava, mas estava ali, caminhando sozinha. O sol começou a afastar a friagem matutina e as pessoas puseram-se a na rua de forma mais confortável. Essas andanças são geniais para tentar por algumas coisas no lugar, estar à deriva. O aleatório te faz ir por caminhos desconhecidos, se perder é necessário ás vezes. Dói no peito se perder, mas   se aprendem outros caminhos. Encontrei um bonito. Uma rua comprida cheia de árvores, e estas árvores cheias de flores. A representação máxima da primavera, um colorido quase fantasioso, o chão forrado de tapete de flores. É incrível como inconscientemente sabemos os caminhos que temos que fazer. Sem querer, quase como um pequeno milagre, com toda essa inquietação eu cheguei ali, uma rua de beleza escancarada nos entremeios da Vila Mariana, com chão e céu de flor. Mas nesse momento, caralho, seria capaz de por fogo em tudo.

domingo, 14 de outubro de 2012

Isto não é uma despedida

O que dizer? Vou tentar não ser ressentida ou raivosa, porque as coisas não se tratam disso. São coisas maiores e bonitas, não devem ser tratadas dessa forma. Comecei a escrever imaginando um campo de batalha, e alguém se retirando com uma bandeira branca encardida, humildemente e machucada. Mas não houve batalha, não houve guerra, porque não havia inimigo, nunca houve. E se houvesse algum, apenas os próprios fantasmas. Mas é hora, de quem se desmanchou sozinha, juntar os pedaços e ver que nunca faltou nenhum deles, apesar da sensação de ausência ás vezes de alguns. Ausência da fala, da respiração, da pele. Remexendo algumas lembranças, você percebe que em várias situações eles sempre estiveram presentes, mas as distrações, melhor, as (in)distrações atrapalharam. Não se trata do que foi perdido, e se essa foi a impressão até agora, me desculpe, mas é que neste momento as palavras aparecem embaçadas e fico um pouco sem controle pra organizar as frases. Eu estou inteira.  O que foi ganho é a questão. Eu nunca me afoguei de verdade, eu acho que eu prendia a respiração sem querer, era isso. Eu tenho tantas coisas em mim, e que eu só ganhei, só cresci, eu quase virei gente. Humano com H maiúsculo. Eu nunca sonhei tanto e nunca tive tanta força pra isso. Nunca tive um querer tão forte e tão grande e tão arrebatador. Logo eu, que sou tão pequena. E ai eu choro, mas porque eu choro. Eu tive meu conto de fadas e o pós que é quando ele se expande pro campo da realidade. Tive tudo, com direito aos acasos da vida e poema de camões, que sou obrigada a discordar, já que é ferida que dói e se sente sim, mas ela é o machucado e o bálsamo pra vida, que é tão difícil. E nada é finito. Essa é minha nova religião. A gente recomeça, sempre. E dessa vez, não quero guardar em gavetas o que senti. Vou deixar ele aqui, no peito, bem grande, luzindo grande e forte, como sempre foi, porque eu não perdi nada, eu só ganhei. Ele está intocado e bonito, como a primeira vez que descobrimos que ele existia. É isso que me faz crescer e ser melhor, é saber que eu aguento sentir isso, que eu tenho muito coração, até mesmo quando eu duvidava se tinha. " A gente se ilude dizendo que não há mais coração", mas tem. E isso, vai ser meu farol. Seja pra você me encontrar ou te iluminar outro caminho. Vencemos. A gente durou pra sempre em algum momento da vida. Perdurou, é a palavra certa. E me desculpa, se agora o que vou dizer lhe parecer duro, mas na verdade, eu nunca precisei de você, nunca. O verdadeiro é que eu sempre quis você. E as coisas, bom, elas se arrumam. Nada é finito, né? Amém.