domingo, 25 de agosto de 2013

Obrigada, Clarice

"...Amo os objetos à medida que eles não me amam. Mas se não compreendo o que escrevo, a culpa não é minha. Tenho que falar pois falar salva. Mas não tenho uma só palavra a dizer. As palavras já foram ditas me amordaçaram a boca. O que é que uma pessoa diz à outra? (...) É preciso ter coragem para fazer um brainstorm: nunca se sabe o que pode vir a nos assustar..." 
Clarice Lispector

Depois de muito tempo, retomo a leitura de suas palavras que por tempos foram um refúgio: conversava com seus livros como converso com um grande espelho, e fiz de seus trechos infinitos espelhos de mim, e se há algo que quase entra no eixo, são pelos versos que sempre me iluminaram de compreensão. Te conheci ainda pequena, na história de uma menina ruiva que encontra um basset ruivo caminhando pela rua, e desde então fico na busca de meus pequenos cachorros ruivos quando ando na rua, e tento manter-me distraída na caminhada, pois a espera te cega para o que é realmente importante. Descobri outros, confesso, que me tocaram tanto quanto, mas, nesse meu reencontro contigo é que encontro o início de mim como consciência de presença: Aprendi a construir-me em palavras, e senti a necessidade de começar a colocar no papel ideias confusas que surgiam no âmago em formas estranhas e incorpóreas que queriam romper a barreira da carne - esse constante vômito sentimental, a troca das partes, estômago, vísceras, pulmões, coração e joelho por cores e formas sutis que se desmancham, se fundem, diminuem ou expandem nos acontecimentos da vida, do céu de janeiro à janeiro. Assim como você, não entendo muito o que são as coisas que escrevo, mas sei, no fundo, que entendemos: em alguma parte no universo do sensível, em alguma gavetinha guardada no coração ou no cérebro, em que temos todas as respostas que achamos não ter: sabemos, alguns mais outros menos. Você sabia demais, e eu tento, miseravelmente e com uma admiração que transcende a admiração saber pelo menos 1/5 do que você soube. Escrevo como alguém que escreve para um amigo, e recosto seus livros em meu peito, para que as frases conversem com algo que não se acessa pelos olhos. Nos seus trechos descobri um pedacinho do que quis ser de mim.

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