quinta-feira, 15 de agosto de 2013

A história da primeira galinha na América

E como julgar a pobre galinha de estar cansada de ciscar sempre o mesmo chão? Ai que dor de sua condição, tão galinha, seu corpinho cheio de penas e as asinhas inúteis para tirá-la da granja em que a haviam enfiado. Quem olha uma galinha, pode acreditar que ela não tem muitas ambições na vida, mas a gente nunca sabe o que se passa no coração de outros seres, muito menos corações em que costumamos temperar com açafrão ou comer em espetinhos. Então, logo que se deu conta que não podia voar, nem era tão veloz e provavelmente só botaria medo em minhocas, viu em uma grande viagem a sua chance. Gosto de pensar que ela tinha qualquer nome parecido com Gaetana. Gaetana, a primeira galinha viajante e sua trupe de galinhas cansadas do mesmo chão e do mesmo milho jogado por uma velha rabugenta.
Quando souberam de uma grande viagem, a viagem para o "Novo Mundo", viram ali a possibilidade de um lugar onde galinhas correriam lentas e felizes por terras e terras de infinitas minhocas: haveriam céus e milhos, um bom lugar para colocar ovos. Finalmente as galinhas desafiariam a perversa natureza e driblariam as chamadas condições naturais. Levadas para um barco no colo, Gaetana e mais uma dúzia de galinhas foram colocadas em um granja improvisada no navio. O rugido do mar ressoava por dentro das paredes de madeira úmida do barco, e seus pescocinhos mexiam independente de seus corpos como uma série de pequenos budinhas em meditação. Será esse o mesmo tempo que demoravam os patos para voar de um lado pro outro? ( Era uma pergunta difícil de responder, afinal, nunca havia visto um pato, só escutado falar do tal que diziam ter penas bonitas).  De vez em quando alguma galinha indisciplinada corria para a superfície do barco e nunca mais voltava - Diziam de um tal lugar no barco onde as galinhas ganhavam tratamento especial, tão especial que nem saiam mais de lá. Mas Gaetana, ah esta se mantinha paciente em seu posto, tinha vontade de ver o que era o tal do mar, mas havia escutado falar de estranhas criaturas que ali viviam, geladas e escorregadias: peixes. Preferia manter-se firme para a chegada no "novo mundo". Saíram de sua terra, terra de humanos de olhos puxados, como heroínas, e assim queria chegar: as primeiras galinhas exploradoras da terra. O coraçãozinho palpitava no peito cheio de penas. E vieram dias e noites. Vieram homens de diferentes cores, chacoalhões infinitos do denso mar, até que um dia um humano gritou no começo da tarde um sonoro " Terra à VISTA!". Gaetana foi invadida por uma sensação esquisita que alguns dizem ser felicidade, apesar de não entender o que aquele grito queria dizer, ou o que era sentir-se feliz, mas escutara muito sobre isso no barco, e deveria ser algo parecido. No barco falavam muito de dinheiro, e decidiu que, assim que desembarcasse, arranjaria dinheiros, seja lá o que fosse isso. Logo o barco bateu em algo sólido e os homens atiraram-se na água para empurrar o barco pra algo que chamaram de praia - à essa altura, nenhum dos bichos, nem os bichos humanos estavam em seu lugar, tudo se movia de um lado para o outro, pois todos queriam ver a tal de praia: muito decepcionada Gaetana constatou que o furdúncio todo era por um monte de areia, mas, não estava lá para julgar e sim para viver. Foi a primeira galinha a descer a rampa do navio sentido ao chão, e quando seus pézinhos tocaram a areia, viu-se afundar. O sol estava alto no céu quando a primeira galinha pisou na América, elegante com sua cabeça draconiana.

Pouco tempo depois Gaetana foi morta com um sonoro cléc de pescoço e a cozinharam em seu sangue, em um prato que depois ficou conhecido como  galinha ao molho pardo. Sorte de quem comeu seu coraçãozinho viajante.

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