Recebi sua mensagem dois dias
depois de ter chegado aos 24. Era de manhã quando o celular vibrou e estava lá,
um áudio de quase 10 minutos esperando para ser ouvido. Claro que era você.
Perto ou longe, ao vivo ou nos longos monodiálogos diante o microfone do whatsapp,
sempre temos muito para falar. De mim, de você, da gente do mundo. Da gente.
Sabe, eu também não tive muito que comemorar este ano, entendo perfeitamente a
parte de não estar feliz com o que se é, ou que se está. E a celebração é
genuína, ela acontece nos pormenores do cotidiano, até sozinho, até com uma
pomba feiosa. Essa obrigatoriedade de comemorar o fim de um ciclo para o começo
de outro. Outro qual? Fim de que? Acordei dois dias depois com a mesma angústia
de uma semana antes. Você lembra como eu sou angustiada, não lembra? As nossas
soluções pareciam tão perfeitas, o nosso mundo ficava tão bonito. Depois de
você, me apaixonei pelo lilás e verde água, eu nunca liguei muito para cores
até então. Engraçado o que a gente liga ou não liga ao longo da vida, comprida
ou curta. Estou na fase dos pastéis, principalmente depois que reencontrei Renoir.
Quando o vi pela primeira vez, decidi que gostava muito de pintar, mesmo com
toda a preguiça que tenho de segurar um pincel. Descobri que gosto de Renoir
por parecer que tudo dança em Renoir, as cores todas, as pinceladas todas, as
moças todas. Queria ter essas cores. Vou pintar o cabelo para ver se fico mais
feliz com quem eu sou. Mas sabe, eu ouvi de novo, e no fim a gente comemorou,
comemoraram por nós. Alguém é feliz com o que somos, fui dormir intranquila com
isso, juro para você. Algum dia a gente vai acordar e se celebrar? Eu tenho
acordado com o som do tec tec da máquina de escrever nos últimos tempos, tenho
uma gata que adora pisar nas teclas. A minha tristeza pode ser falta de sono,
só falta de sono. Vou te mandar uma foto dela escrevendo, é engraçadinho. Não é
super engraçado: é engraçadinho. Eu te celebrei, sabia? Rodopiei sozinha feliz
por você que está no mundo. Uma volta e depois outra, que nem os ciclos, essa
palavra que deram um significado redondo (como se essa fosse a única maneira de
se renovar). O aniversário não parece muito pra gente mesmo, é mais um ano
existindo para alguém. Para mim, o seu aniversário foi muito importante, apesar
de sabermos que acordamos e deitamos sem sentir essa grande mudança chamada
anos. Sentimos só quando o rosto já rachou demais, ou quando decidimos ser
sérios demais. E depois de sérios demais decidimos relaxar: a minha dúvida: os
anos colocam ou retiram a gravidade das coisas? Jovens graves para velhos leves.
Eu sou feliz por quem você é, mesmo que não seja o que você imaginava de si. E
só levantei por saber que eu alguém sente isso por mim também e sabe: o puto
motivo, a gente nunca vai descobrir.
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